Carlos Drummond de Andrade e a arte de desenhar
"Rabiscar figurinhas sem saber mesmo o que sairá do traço canhestro. Seria ótimo ter nascido caricaturista. Na rua, ao ver desconhecidos, costumo identificá-los: ‘Este foi desenhado pelo Kalixto. Esta é puro J. Carlos. Olha ali a gordona do Raul. Quem inventou esse foi Ziraldo.’ Penso num museu de caricatura, que não sei se existe no exterior, e que eu visitaria sempre, se existisse no Rio."
Drummond, O observador no escritório, 1.º de janeiro de 1976.
O poeta Carlos Drummond de Andrade tinha verdadeiro apreço
pelo traço do desenho e pelas artes gráficas. Logo cedo, ainda criança teve seu primeiro contato com os traços dos quadrinhos, como a adaptação para os quadrinhos de Robinson Crusoé (foto) que leu aos nove anos e retomaria a personagem comparando-se a ela no poema "Infância" Parece até ser redundante porque
desconheço, pelo que ando a procurar da relação entre escritores e artes
plásticas, algum que não tenha tido. E não vou aqui citar nomes. Quem acompanha
o Letras verá o que estou falando.
Do apreço pelo desenho, o que mais se conhece de Drummond
será as próprias autocaricaturas, muita delas publicadas aqui acolá nos seus
livros de poesia. Mas, o poeta também tem uma significativa produção de
desenhos. Estive sabendo em matéria publicada na revista Veja de 2009, que a família estava preparando uma edição com toda sua produção artística. Mas, dei uma corrida on-line por esta obra e não encontrei nem sombra.
![]() |
(clique na imagem para ampliar) Carta de Carlos Drummond de Andrade para seu neto Pedro Augusto. Muito dos desenhos que o avô veio descartar no lixo foram "resgatados" por Pedro. |
Tudo lhe vinha como um passatempo. Eram rabiscos que vazia
quando falava ao telefone ou nas horas vagas em casa. Mesmo consciente de que não
levava jeito para a coisa, muito dos desenhos seus ficaram. Muitos ele descartou.
E outros o neto Pedro Augusto (a quem dirigiu o desenho que se lê na ilustração
acima) recolheu da lixeira sem que o avô percebesse. Pedro foi quem primeiro
chegou a organizar os desenhos de Drummond.
A matéria publicada na Veja
atesta que o único conjunto organizado de desenhos do poeta encontra-se na
Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro: é um caderno com cerca de
trinta desenhos, sem identificação e feitos com esferográfica e todos num mesmo
dia de 1983 (muitos dos desenhos estão reproduzidos no catálogo abaixo). Outra quantidade de desenhos está em mãos de escritores amigos: “A
crítica de arte Lélia Coelho Frota ganhou de presente três autocaricaturas e
dois retratos dela feitos pelo poeta em papel timbrado do Ministério da
Educação, onde trabalhava. No mesmo papel barnabé, o autor traçou quatro
desenhos, de frente e de perfil, de Lygia Fagundes Telles, que foram
presenteados à amiga escritora.”
Numa das crônicas que escreveu para o Jornal do Brasil chegou a dizer que “o caricaturista é uma pessoa
que nos ajuda a viver, manifestando o cômico subjacente no trivial, no grave ou
no dramático. Rimos dos outros sem desconfiar que rimos de nós mesmos e da
condição humana.”
Na ausência de uma edição com caricaturas (suponho) o Letras
elaborou um folder com alguns de seus desenhos pescados na web.
Comentários