Contos de Platônov: presente literário
Por Marcelo Jungle Andrei Platônov é o escritor da piedade que escreve com um coração ressequido. Essa contradição — ternura e aridez — define toda a sua obra e exige do leitor uma disposição paradoxal: aceitar que o amor pela humanidade pode manifestar-se precisamente através da linguagem que recusa consolar. Em seus últimos contos, essa tensão atinge seu ponto mais agudo. O amor pela pátria e outras histórias , segunda coletânea de contos do autor lançada pela editora Ars et Vita em tradução direta do russo por Maria Vragova, reúne textos do período final — escritos entre 1936 e 1946. Nessa época, já marcado pela perseguição política e pela morte prematura do filho, voltou-se para narrativas que, à primeira vista, parecem sem sentido, protagonizadas por crianças e velhos — os guardiões da verdade. Sob a singeleza desses contos esconde-se uma das literaturas mais radicais do século XX. Em plena consolidação da União Soviética, ele parece ter buscado a salvação da alma ainda durante a ...