O primeiro livro de Jorge Luis Borges

Por Andrea Aguilar 


Quando publicou o primeiro livro, Jorge Luis Borges tinha 24 anos. Foi uma edição um tanto apressada em que se colaram algumas erratas e cuja capa foi ilustrada pela irmã Norah. Composto com 45 poemas, sem prólogo, o poeta dedicava à sua cidade natal, lugar para onde havia regressado há apenas dois anos, depois de passar sete com a família na Europa, conhecendo antecipadamente os ares das vanguardas. 

Décadas mais, Borges recordaria que naqueles poemas “buscava os entardeceres, os arrabaldes e a miséria”. E assim nesses versos falava de “ruas taciturnas”, enquanto se perguntava “se esta numerosa Buenos Aires não é mais que um sonho que erige compartilhado como a magia das almas”.

“O título, Fervor de Buenos Aires, mesmo hoje soa notável. Borges se entusiasma com o reencontro, e é a cidade a que aparece; a mesma, diferente”, disse a hispanista Lia Schwartz durante a apresentação no Instituto Cervantes, sede de Nova York, acerca da primeira edição ilustrada deste livro publicada em comemoração aos 90 anos da estreia de uma das vozes mais importantes e transcendentais da literatura em língua espanhola. 

O novo livro, cuja edição se publica a cargo de Pedro Tabernero, apresenta as ilustrações coloridas do argentino Pablo Racioppi ao lado dos 35 poemas que Borges selecionou e revisou na reedição de 1969 desta obra. Nesta versão se incluiu também algumas notas, segundo Schwartz, sobre o que se definia como “um selvagem único” e afirmava que só havia rotulado “sentimentalidades”. Apesar de acometer trocas, o próprio Borges reconheceu muitos anos depois que nesta primeira antologia – com ele que abre sua fase vanguardista que continua com Luna de enfrente e Cuadernos de San Martín – se encontrava as chaves de todo seu trabalho posterior.

A versão ilustrada de Fervor de Buenos Aires inclui também duas apresentações, uma de José María Conget e outra do aluno de Borges e mais adiante professor Isaías Lerner, esposo de Schwartz, e falecido recentemente. Na mesa redonda moderada por Javier Rioyo, diretor da sede novaiorquina do Instituto Cervantes cuja biblioteca leva o nome de Borges, María Kodama, viúva do escritor, falou do editor Pedro Tabernero como de um “médium” que conseguiu reunir Borges com seu amigo e aluno.

Kodama também mencionou outro bom amigo de Borges, o pintor Oscar Schulz Solari, cuja relação com o escritor é o foco da exposição The art of friendship, que reúne aquarelas, documentos, manuscritos e fotografias, na Americas Society. “Uma das tantas coisas a se agradecer a Borges são as amizades que deixou ao redor do mundo”, disse. Em seguida Schwartz recordou do seu último encontro num restaurante japonês em Nova York e as aulas que ouviu de Borges sobre Literatura Inglesa em Buenos Aires.

O editor Tabernero falou da constante recorrência que tem a obra na hora de uma coleção em que se tem publicado três títulos (Poeta en Nueva York, de Lorca, Diario de un poeta recién casado e Sombra del Paraíso) e adiantou que o seguinte título será El contemplado, de Pedro Salinas. Fervor de Buenos Aires será apresentado também na capital argentina e junto a uma exposição e em Madrid. 

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Por aqui, uma edição como esta não deve passar no radar dos editores. Na obra completa editada pela Companhia das Letras, o leitor encontra Fervor de Buenos Aires reunido numa antologia intitulada Primeira poesia. Neste livro, estão ainda versos esparsos do poeta argentino e os livros Lua defronte e Caderno San MartínAqui, uma amostra com os seis primeiros poemas do livro de 1923. 

Ligações a esta post:
>>> Leia aqui sobre Jorge Luis Borges.
>>> Ouça aqui o poeta a ler alguns de seus poemas.


* Esta matéria é a tradução de Buenos Aires y el fervor de Borges, publicada no jornal El País.

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