Tolstói e os anos de aprendizagem





Qual a idade certa para se aprender um ofício, ou começar a trabalhar numa ideia, ou a mudar o rumo da vida? Alguns concordam que há uma idade certa para tudo, outros dizem que você nunca está velho demais para fazer algo novo. Vou antes de me deter no exemplo de Tolstói dizer um que conheço de cor: José Saramago escreveu seu primeiro romance aos 27 anos. Desestimulado, trocou a ideia de ser escritor de romances pela a de cronista. Exercitou em silêncio o ofício e se tornou um romancista aos cinquenta e tantos quando já havia feito de um tudo e consagrou-se em 1998, com a recepção do Prêmio Nobel de Literatura, o primeiro dado a um escritor de língua portuguesa.

Pois bem, o Magazine, do jornal The New York Times numa publicação do dia 14 de setembro recorreu ao caso de quatro celebridades que fizeram algo de novo nas suas vidas quando já a grande maioria poderia achar que eles não poderiam fazer na idade em que se encontravam: a cientista Marie Curie, pioneira na pesquisa sobre radiação e ganhadora do Prêmio Nobel de Física duas vezes aprendeu a nadar depois dos 50, ensinada pelas duas filhas; Rand Ayn, escritora, dramaturga e roteirista, conhecida no Brasil pelo livro A nascente e o filme Vontade indômita, começou sua coleção de selos aos 60 anos de idade; Miles Davis, o ícone do jazz que aos 20 anos estava na luta contra o vício da heroína, inspirado pelo campeão dos pesos médios Sugar Ray Robins, começou a lutar boxe já na casa dos 30; Dwight D. Eisenhower começou a pintar quando tinha 58 anos.

Tolstói e o que pode ter sido sua primeira bicicleta.

E o exemplo mais inusitado da lista: Tolstói, o autor de Anna Kariênina e Guerra Paz teve sua primeira lição de bicicleta aos 67 anos, um mês depois da morte de seu filho de sete anos de idade, Vanichka, quando recebeu a doação de uma. As aulas de instrução se seguiram todos os dias pela sua propriedade rural e depois de aprender a guiar sozinho o escritor incorporou a prática no rol das suas tarefas matinais. Basta lembrar que veículo na Rússia do escritor era ainda objeto caro e restrito aos das classes dominantes como relata o escritor em “Mas precisa mesmo ser assim?”, texto incluído na coletânea Os últimos dias, em que Tolstói descreve o brilho niquelado da bicicleta e a velocidade que ainda era capaz de assustar os humildes pedestres.

É isto. E você, no que aposta fazer mesmo?



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Boletim Letras 360º #579

Boletim Letras 360º #573

Seis poemas-canções de Zeca Afonso

Confissões de uma máscara, de Yukio Mishima

A bíblia, Péter Nádas

Boletim Letras 360º #575