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Seis poemas de Natal pela pena de autores lusitanos

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Por Pedro Belo Clara Rudolf Bernhard Willmann, Árvore de Natal  (detalhe) LADAINHA DOS PÓSTUMOS NATAIS  (David Mourão-Ferreira, Cancioneiro de Natal ) Há-de vir um Natal e será o primeiro em que se veja à mesa o meu lugar vazio Há-de vir um Natal e será o primeiro em que hão-de me lembrar de modo menos nítido Há-de vir um Natal e será o primeiro em que só uma voz me evoque a sós consigo Há-de vir um Natal e será o primeiro em que não viva já ninguém meu conhecido Há-de vir um Natal e será o primeiro em que nem vivo esteja um verso deste livro Há-de vir um Natal e será o primeiro em que terei de novo o Nada a sós comigo Há-de vir um Natal e será o primeiro em que nem o Natal terá qualquer sentido Há-de vir um Natal e será o primeiro em que o Nada retome a cor do Infinito CHOVE. É DIA DE NATAL (Fernando Pessoa, Poesias ) Chove. É dia de Natal. Lá para o Norte é melhor: Há a neve que faz mal. E o frio que ainda é pior. E toda a gente é contente Porque é dia de o ficar. Chove no N...

Boletim Letras 360º #670

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DO EDITOR Caro leitor,  É chegada a hora do nosso recesso de final do ano. Regressamos às atividades normais a partir 23 de janeiro de 2026. Até lá, as publicações por aqui serão esporádicas e as edições deste boletim sairão mais enxutas, deixarão de oferecer as comuns seções de dicas. Quer ficar por dentro de tudo? Entre para o nosso grupo no Telegram . Aproveitamos o espaço para divulgar que muito em breve divulgaremos a chamada para novos autores que queiram integrar o grupo de colaboradores com o nosso projeto. Enquanto isso, se você possui esse interesse, prepare seus materiais. Saiba mais da nossa linha editorial e de como organizar seus textos aqui . Ah, e se conhece alguém que gostaria de ler em nossas páginas, já avisa do nosso interesse!  Agradecemos pela companhia e esperamos continuar ao seu lado pelo nosso 19º ano na web ; sua presença é a base essencial para a existência do Letras. Não importa como. Na leitura deste e de outros materiais apresentados aqui, no com...

Sobre Manual de estoicismo: a visão estoica do mundo

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Por Afonso Junior Sempre que leio Epicteto (filósofo nascido em torno ao ano 50 na Frígia) eu tenho a sensação de ser pego de surpresa com alguma percepção muito impactante sobre a vida cotidiana. Também Marco Aurélio parece nos sacudir com sua filosofia crua; quando, por exemplo, fala (a nós, mergulhados no caos do carbono) da “respiração conjunta” de todos os seres e da “unidade da substância” ( Meditações , 6.38). Eu os leio com espanto, e não apenas com curiosidade.   Eu me lembro de um professor do mestrado que nos orientava a “não escrever para a massa” (também havia quem não achasse que todos tinham de ter faculdade, já que seriam sempre necessários “bons padeiros”). “As pessoas que lerão o seu trabalho”, dizia, “são especialistas, e não convém ser muito didático”.  Lembro de que sentimos um certo incômodo com o fato de que tanto esforço era para ser “consumido” por um grupo tão seleto. É natural que, numa sociedade capitalista, que cria desigualdades, diversos nív...

Vaim, de Jon Fosse

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Por Pedro Fernandes E se descobríssemos que a nossa vida foi determinada por escolhas alheias a nós? E se a vida que levamos com alguma determinação própria for, na verdade, a repetição de outra vida que também ignoramos? E se em algum momento, por uma razão desconhecida, pudéssemos assumir a consciência dessas duas possibilidades, o que faríamos com isso? Essas podem ser algumas das questões encontradas na base das três narrativas que constituem Vaim , o primeiro romance de Jon Fosse depois do prêmio Nobel de Literatura e o primeiro de uma trilogia sobre a povoação fictícia que dá título ao livro. O leitor da obra desse escritor não deixará de primeiro reparar nessa que pode ser uma das suas obsessões, o uso da numerologia com variável sentido simbólico, nesse caso, o número três. Três livros à volta de Vaim, mas este primeiro estrutura-se em três partes, constituídas como dissemos em três narrativas, em torno de três personagens que formam um inusitado triângulo amoroso marcado por t...

Uma câmera no caminho da máquina de limpeza étnico-territorial: No Other Land

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Por Luis Fernando Novoa Garzon “Depois de Auschwitz não ocorreu nada que haja revogado ou refutado Auschwitz.”  — Imre Kertész, Discurso de recebimento do prêmio Nobel de Literatura de 2002. A estigmatização, a despossessão e o posterior intento de extermínio dos inimigos de ocasião continuam sendo regra nos processos contemporâneos de expansão econômica e militar ao redor do mundo. Nos termos de Kertész, o escritor-testemunha, o método Auschwitz continua sendo o expediente basal de processos de obtenção de supremacia, que depende da supressão integral de potenciais alteridades e contrapesos. Foi durante e após a experiência narrada em Sem destino  que o escritor judeu-húngaro chegou a esta conclusão. Nesta obra, o autor apresenta paralelos atordoantes com o cinema de testemunho de No Other Land . O cenário de sua deportação da Hungria para Auschwitz, em 1944, é retraçado pelo olhar do adolescente que era, procurando compartilhar deliberadamente com o leitor níveis similares d...

Subsolos de Lima Barreto e Lev Tolstói

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Por Rafael Bonavina  Quando pensamos na Rússia, talvez venha à nossa mente alguns elementos que nos chamam atenção, como a neve, a rigidez no trato, as danças populares, as comidas típicas. Enfim, todas essas coisas que nos diferenciam, que nos afastam. É preciso apertar um pouco os olhos para vermos o que temos em comum com esses primos distantes. Mas, depois desse esforço inicial, começam a despontar os pontos de contato, desde o humor popular até a literatura erudita. E é justamente aí que gostaríamos de nos deter. Não é segredo que a literatura russa é de uma riqueza e complexidade imensa, assim como a brasileira; por isso, quando as duas se tocam, o resultado geralmente é, no mínimo, interessante, quando não, verdadeiramente valioso. Tampouco é novidade que Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski era usado como uma espécie de medida com que se comparava outros escritores, por exemplo, Machado de Assis diversas vezes foi avaliado como uma espécie de Dostoiévski brasileiro. Isso também...