Recriar o “Eu”, de Augusto dos Anjos
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Fac-símile com opinião de Carlos Drummond de Andrade acerca do livro Eu, de Augusto dos Anjos. A imagem está disponível no tumblr do professor Moreno Barros, aqui. |
“Li
o Eu na adolescência e foi como se levasse um soco na cara. Jamais eu
vira antes, engastadas em decassílabos, palavras estranhas como simbiose,
mônada, metafisicismo, fenomênica, quimiotaxia, zooplasma, intracefálica... E
elas funcionavam bem nos versos! Ao espanto sucedeu intensa curiosidade. Quis
ler mais esse poeta diferente dos clássicos, dos românticos, dos parnasianos,
dos simbolistas, de todos os poetas que eu conhecia. A leitura do Eu foi
para mim uma aventura milionária. Enriqueceu minha noção de poesia. Vi como se
pode fazer lirismo com dramaticidade permanente, que se grava para sempre na
memória do leitor. Augusto de Anjos continua sendo o grande caso singular da
poesia brasileira.”
O depoimento é de Carlos Drummond de Andrade para o livro de
Augusto dos Anjos. Eu é obra singular
na literatura brasileira. Não dispõe de um lugar próprio no nosso cânone literário.
E isso é o que faz essa obra dispor pelo menos duas correntes de leitura: uma,
que se espanta com o poder que o poeta paraibano incute à palavra científica,
outra, que não aceita esse rico trabalho como materialidade da poesia. Verdade é
que os da segunda corrente foram já quase que enterrados com o que pensava
Manuel Bandeira, o representante maior dela. Preso no território de um poetar em falso do parnasianismo, para ele o Eu era um livro malcriado, de mau gosto.
E, na ocasião da morte de Augusto dos Anjos, Olavo Bilac, teria dito: “Não
lamente. A poesia brasileira não perdeu grande coisa.” E o Eu ganha uma admiração popular e pode-se mesmo atribuir ao povo a
conquista do lugar que ele terá muitos anos após a morte de seu autor. O poeta recitado
por bêbados teve entre o povo fluência que não alcançou no seu tempo e hoje sua
obra é um dos livros mais reeditados no Brasil, fato que nem Bandeira e nem
Bilac conseguiram, nem em vida, nem depois de mortos.
2012 é o ano em que este livro fecha seu centenário. Pela data, postei por aqui, dia desses, um texto meu editado no caderno Domingo, do Jornal De
Fato. Nele, procuro ler a grandiosidade do trabalho empreendido por Augusto dos
Anjos na confecção da palavra poética e elaboração do seu Eu multifacetado.
Já havia na web
várias alternativas de homenagem ao escritor: uma, que se diz a mais antiga,
posta on-line desde os idos 1995.
Esta, talvez seja a mais completa, porque além dos dados biográficos reúne
parte significativa da obra poética de Augusto, opiniões públicas de
importantes nomes como essa de Drummond com que abro este post, entre outros.
Agora,
o Jornal Paraíba Online montou um hotsite que homenageia os 100 anos do Eu. Nele, encontramos um Augusto dos
Anjos renovadamente moderno e outras faces da sua obra, seja a da
música, seja a da representação oral com Arnaldo Antunes, Elba Ramalho, Othon
Bastos e Vladimir de Carvalho, seja a dos quadrinhos, seja ainda a adaptação
para o cinema com a amostra de três curtas produzidos com base na poesia de Eu. A página reúne ainda os seus mais
conhecidos poemas e destaca excertos das principais formulações críticas em
torno da obra, como o clássico ensaio escrito por Ferreira Gullar. A novidade
vale muito uma visita. Basta ir por aqui.
Para ir ao projeto de 1995, é só ir aqui. Há também um hotsite criado pela TV Senado por ocasião dos 95 anos do livro de Augusto dos Anjos. Pela época, o canal de TV dispôs um documentário que destaquei na página do Letras no Facebook por esses dias, Eu, estranho personagem (que pode ser assisto aqui, parte 1, e aqui, parte 2); daí, criou o hotsite, mas está a muito precisando de uma manutenção. Fica, de todo modo, o registro.
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