Boletim Letras 360º #651
DO EDITOR
Na aquisição de qualquer um dos
livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a
manter o Letras.
![]() |
Zadie Smith. Foto: Fabian Sommer |
A partir de uma trama vertiginosa que conduz da realidade crua das cidades às relações entre espíritos, animais e mortos que habitam outros planos de existência, este thriller amazônico mergulha nos dilemas da Amazônia atual devastada pela ação dos madeireiros e das redes do narcotráfico, pela conivência de políticos com esquemas criminosos, pelo assassinato e ocultação de cadáveres, contrastados de maneira singular com os vínculos afetivos e poéticos que permeiam as relações entre pessoas humanas e mais do que humanas. Com Os urubus não esquecem Pedro Cesarino consolida uma dicção autoral poderosa e uma forma ficcional singular, que traz para a literatura uma perspectiva única sobre as crises atuais e suas relações com os povos da floresta. Publicação da Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
Romance aposta nas possibilidades de transformação trazidas pela dor e pelos fantasmas da ausência.
Como se conta a história de uma
família? Quais peças compõem as memórias? O que sabemos sobre alguém, além do
que essa pessoa escolhe nos mostrar? Uma família se parte em pedaços e
seus integrantes buscam maneiras, às vezes sutis, às vezes extremas, de colar
os cacos. Uma mãe que prefere o silêncio, uma tia que cuida dos sobrinhos
enquanto a vida desmorona ao seu redor, uma filha que busca a felicidade em
qualquer lugar que não ali. Personagens que se refugiam em empregos ou no
trabalho de cuidado, e que recorrem à tecnologia como forma de organizar suas
emoções, de realizar pequenos atos de vigilância ou simplesmente de sobreviver
neste mundo precário. No estilo da arte japonesa que dá
título ao livro, María José Navia reconstrói as vidas destruídas dos
protagonistas, destacando lindamente suas cicatrizes, tanto daqueles que
partiram quanto dos que ficaram para trás. Uma história que explora a interioridade
dos personagens e seu desenvolvimento ao longo do tempo, nas aparências, nos
silêncios e principalmente nas possibilidades de transformação trazidas pela
dor e pelos fantasmas da ausência. Kintsugi é publicado pela editora Rocco; a tradução é de Isis Batista. Você pode comprar o livro aqui.
Em romance com tintas
autobiográficas, Manoela Sawitzki joga luz sobre o processo de se tornar
mulher, a delicadeza das dinâmicas familiares e o modo como o luto é capaz de
reconfigurar vínculos.
Numa cidade pequena do Rio Grande
do Sul, Manu é uma jovem às vésperas da adolescência. Dentro e fora do ambiente
doméstico, onde a masculinidade domina, ela percebe que ser mulher é uma
condição que limita seu lugar no mundo — uma fonte de privação e angústia. Cedo
a garota chega à conclusão de que precisa encontrar uma rota de fuga, de
preferência bem longe dali. Já adulta, morando em outra cidade, Manu recebe a
notícia de que o pai está muito doente e decide visitá-lo. O retorno é um
caminho doloroso: por um lado, a força a se haver com mágoas do passado; por
outro, oferece a chance de ressignificar uma relação marcada pela
incompreensão, pelo silêncio e pela violência. Filha sai pela Companhia
das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
Uma entrada pela Letônia, país
cuja história é um concentrado de dor e emoção.
Entre as histórias amargas da
Europa do século XX, a da Letônia é uma concentração de dor e remoção. Um longo
domínio soviético, três anos de ocupação nazista, a comunidade judaica quase
totalmente destruída. Depois, nas décadas seguintes, um silêncio surdo, um
esquecimento reservado tanto para as vítimas quanto para os carrascos. Entre
eles estavam os membros do famoso Comando Arājs, considerado responsável por
reunir os habitantes do gueto de Riga e levá-los à morte na floresta de
Rumbula. Alguns, como o "Lindbergh letão" o herói da aviação Herberts
Cukurs, escaparam para a América do Sul. Outros desapareceram no ar, como o avô
de Linda Kinstler. Ano dez do novo século: a notícia de que o procurador-geral
da Letônia abriu uma investigação sobre Cukurs faz com que a autora se
aprofunde nos assuntos de seu país natal e de sua família. Assim, Kinstler
retraça a história de Cukurs, morto há muito tempo — o Mossad o assassinou em
1965 —, mas objeto de uma intensa campanha de reabilitação, e segue o rastro de
seu avô Boris, de quem não se ouve falar desde o final da década de 1940. Ao
fazer isso, ela se aventura na complexa relação que a nova Letônia europeia tem
com seu passado e tenta explorar a maneira pela qual “a memória do Holocausto
se estende ao presente e o condiciona”. Da história familiar, passamos
inevitavelmente para a coletiva, reconstruída por meio de depoimentos de
sobreviventes e seus filhos, da crônica de julgamentos realizados na Alemanha,
na União Soviética e em Israel, de artigos em jornais brasileiros e de cartas
trocadas por refugiados judeus em todo o mundo. Guiado pelas reflexões do
acadêmico Yosef Yerushalmi, que se pergunta se o oposto do esquecimento não é a
memória, mas a justiça, a autora ilumina os aspectos legais e os dilemas
familiares, os legados privados e coletivos, observando “os fracassos, as
vitórias e os silêncios da lei”, e tentando entender o que significa preservar
a memória nesta nova era incerta. O contrário do esquecimento: o Holocausto
entre memória e esquecimento sai pela editora Âyiné. A tradução é de
Giovani T. Kurz. Você pode comprar o livro aqui.
REEDIÇÕES
Este surpreendente romance de
estreia, publicado quando a autora tinha apenas 25 anos, arrancou elogios de
críticos e escritores consagrados, recebeu prêmios e se transformou num
fenômeno de vendas.
Segunda Guerra Mundial, Atenas,
1945. O conflito se encaminha para o fim — assim como a amizade entre o inglês
Archie Jones e o bengali Samad Iqbal, soldados de uma divisão de tanques do
Exército Britânico encarregada de construir pontes e corredores de batalha. Por
obra do destino, porém, eles vão se reencontrar trinta anos depois, num bairro
pobre de Londres. Recém-saído de um casamento desastroso e cansado de um
emprego de quase três décadas, Archie tenta o suicídio, mas um açougueiro
muçulmano o salva. Archie começa vida nova ao conhecer Clara, uma jovem
jamaicana de dezenove anos. Para livrar-se da mãe religiosa, Clara se casa com
Archie e dá à luz a menina Irie Jones. Samad imigrara para a Inglaterra poucos
anos antes. Trabalha com garçom num restaurante indiano. Com a mulher que lhe
fora prometida antes mesmo de ela nascer, tem dois filhos, gêmeos idênticos e
de personalidades opostas: Millat, rebelde e muçulmano militante, e Magid, mais
inglês do que muitos ingleses. A relação entre os dois irmãos se complica
quando Magid apoia certas experiências de modificação genética realizadas pelo
cientista Marcus Chalfen, chefe de uma família judia de intelectuais. Os Jones e
os Iqbal convivem em Willesden, subúrbio de Londres, e a nova companhia dos
Chalfen vem acirrar os conflitos religiosos, étnicos e morais que dividem duas
gerações. Dentes brancos relembra raízes históricas da colonização
britânica e compõe um mosaico da Inglaterra multicultural de hoje. A partir de
temas como diversidade racial e os limites da ciência, Zadie Smith constrói uma
ficção ao mesmo tempo divertida, irônica e profunda, aclamada pela crítica e
pelos leitores. Reedição da Companhia
das Letras. Tradução de José Antonio Arantes. Você pode comprar o livro aqui.
Edições Cosac reedita livro que
reúne as fábulas de Esopo.
São 383 fábulas atribuídas a
Esopo, traduzidas diretamente do grego por Maria Celeste C. Dezzotti,
professora da Unesp, que propôs uma maneira completamente original de organizar
a obra. A tradutora optou por utilizar como fontes a compilação do editor Émilie
Chambry — tida como referência — e acrescenta ao também editor Ben Perry, mais
atual e completo que o anterior. Com isso, somam-se 26 fábulas ao corpus
comumente usadas. Outra da tradutora é a disposição da moral, que vem separada
da narrativa para deixar claro o seu caráter novidade de argumentação — e não
de conduta ou comportamento, como se convencionou referir às fábulas. A editora
chamou o jovem artista Eduardo Berliner — destaque na 30ª Bienal de São Paulo —
para também renovar a interpretação pictórica das fábulas, disposta nesta
edição em ordem alfabética. Assim, a edição de Esopo – fábulas completas
revisita as antigas fábulas gregas em uma experiência de leitura completamente
nova. É, ao mesmo tempo, uma referência acadêmica e uma ótima porta de entrada
para se deliciar com os animais tão conhecidos do autor clássico grego. Você pode comprar o livro aqui.
Nova edição de O fotógrafo,
romance que marca um ponto de inflexão na carreira de Cristovão Tezza.
A partir do romance publicado
originalmente em 2004, Tezza começa a burilar a técnica narrativa de
simultaneidade de tempo e espaço que marcaria, de forma definitiva, seus
trabalhos posteriores, incluindo o best-seller O filho eterno,
lançado três anos depois. Ao subverter a ordem cronológica e
geométrica dos fatos, reduzindo ao mínimo os diálogos, o romancista abre espaço
para uma rica narrativa na qual memória, sonhos, pensamentos intrusivos e
reflexões sobre os mais diferentes temas são amalgamados em uma história com
múltiplos pontos de vista. A ação se passa às vésperas das eleições
presidenciais de 2002 no Brasil. O fotógrafo do título é contratado para fazer
imagens da modelo Íris, sem que ela saiba. Tudo muito misterioso. Por cada rolo
de filme entregue, receberá 200 dólares em espécie. O fotógrafo começa a se
interessar pela modelo, o que tensiona ainda mais seu casamento com Lídia, que,
prestes a ingressar no mestrado, se vê envolvida com o professor Duarte, que
por sua vez é casado com Mara, a analista de Íris. Tem-se então uma espécie de “Quadrilha”
drummondiana, onde tudo vai se desenrolando aos poucos, em guerrilhas mentais
travadas pelas personagens. Tezza também antecipa aqui o “diálogo de surdos”
que marcaria o debate político (ou a falta dele) na sociedade brasileira nas
décadas seguintes. A partir das imagens — reais e imaginárias —, os personagens
constroem realidades paralelas, sonhos e pesadelos em meio a relações
fraturadas. Tudo isso se passa em Curitiba, cidade que Tezza retrata tão
profundamente sem a pretensão de explicá-la. Depois de uma sequência de ótimos
livros, alguns deles com a marca contracultural de sua juventude, Tezza
desembarca aqui nos anos 2000 com um romance poderoso, que o consolida como um
mestre da ficção brasileira. A nova edição sai pela editora Record. Você pode comprar o livro aqui.
RAPIDINHAS
Literatura do Rio Grande do
Norte: antologia. O livro organizado por Constância Lima Duarte e Diva
Cunha publicado em 2001 ganha nova edição revista e ampliada e reúne uma
cuidadosa seleção de poemas, contos, excertos de romance, crônicas e
correspondências de autores que se destacaram na literatura potiguar.
Edimilson de Almeida Pereira
até agora. A obra do poeta é novamente reunida. Em Poesia & Agora,
publicado pela Mazza Edições, sai os 28 livros que o juiz-forano escreveu desde
1987.
Sobre heróis e tumbas. A Pinard
quer ampliar o catálogo da Coleção Prosa Latino-Americana com o romance de
Ernesto Sabato publicado em 1961 e há muito esgotado entre os leitores brasileiros. O projeto de financiamento coletivo está
aberto aqui.
Os próximos títulos das Edições
Cosac. São dois livros interessados em pensar os temas da doença e da
finitude: A doença e a cura, de Márcio de Souza Soares pensa os
temas em evidência entre a população carioca do fim do século XVIII e início do
XX; e Nas fronteiras do além, de Claudia Rodrigues, examina o processo de
secularização das atitudes e representações católicas da morte nos séculos
XVIII e XIX também no Rio de Janeiro.
O russo que falava português.
As Edições Jabuticaba resgatam um marco da poesia homoerótica editada no Brasil:
Nos odres velhos, de Valério Pereliéchin. O livro sai com apresentação
do poeta Ricardo Domeneck.
DICAS DE LEITURA
1. Um amor, de Dino Buzzati
(Trad. Tizziana Giorgini, Nova Fronteira, 240p.) A história do amor entre um
arquiteto de meia-idade e uma jovem prostituta serve para o exame de algumas
das questões centrais na obra do escritor italiano: a nostalgia, o vazio e a
solidão. Você pode comprar o livro aqui.
2. Toda poesia, de Paulo
Leminski (Companhia das Letras, 424p.) O livro que tornou o poeta curitibano
uma figura pop; um resgate que lançou novas luzes para sua obra que é um marco
na literatura brasileira de entre-décadas 1970-1980. Você pode comprar o livro aqui.
3. As árvores, de Percival
Everett (Trad. André Czarnobai, Todavia, 362p.) Uma série de assassinatos
brutais de negros na pequena cidade de Money avança sobre um tema sempre urgente porque perene no contexto estadunidense: o racismo. Você pode comprar o livro aqui.
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
A Imprensa Nacional de Portugal,
que já disponibilizou online 19 volumes da edição crítica da obra de Camilo Castelo
Branco, abriu uma seção entre os digitais dedicada a pensar a obra do escritor
que alcançou o bicentenário neste ano de 2025. Na Camiliana, é assim que se
intitula a referida pasta na estante, saiu, agora, organizado por Ivo Castro o Glossário
camiliano 1.0. Ora, em dias de declínio do nosso léxico, parece ser este um
bom guia para todo aquele interessado em descobrir uma das funções mais belas
da literatura — a de oxigenar a língua, cf. dizia Umberto Eco —, mas também a
quem quiser encontrar um atalho por fora da pobreza linguística que nos grassa. Aqui.
BAÚ DE LETRAS
No dia 8 de agosto de 2025, passaram-se 60 anos da morte de Shirley Jackson. A escritora só agora redescoberta como um dos nomes relevantes para a literatura de horror esteve numa publicação recente por aqui a respeito do seu livro Sempre vivemos no castelo.
Já no dia 12 de agosto de 2025,
passam-se 70 anos da morte de Thomas Mann. Vale atualizar esta seção com
algumas das entradas recentes em torno do escritor e sua obra tantas vezes
lembrados aqui. Dessa vez, chamamos atenção para três textos: uma resenha do nosso colunista
Juliano Pedro Siqueira de José e seus irmãos; este texto em torno do
romance de Colm Toíbín que reconstrói a vida do autor alemão; e este de Joaquim
Serra com revisões da leitura de Paul Ricouer de A montanha mágica.
E, por destacar Zadie Smith, vale
resgatar esse decálogo oferecido pela escritora aos interessados na lida com a
literatura e que traduzimos há muito no Letras.
DUAS PALAVRINHAS
A liberdade deve descobrir a sua
virilidade. Tem que aprender a andar com couraça e defender-se contra seus
inimigos mortais
— Thomas Mann, em “Ordem do dia”.
...
Quer receber as nossas publicações diárias? Vem para o nosso grupo no Telegram
* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.
Comentários