Boletim Letras 360º #662

DO EDITOR

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Eugène Ionesco. Foto: Pohlmann




LANÇAMENTOS

Dois novos livros ampliam a presença do teatro de Eugène Ionesco entre os leitores brasileiros. 

1. Encenada pela primeira vez em 1953, Vítimas do dever é a peça em que Ionesco satiriza o teatro realista ao colocar um inspetor diante de um homem comum, num interrogatório que rapidamente mergulha no absurdo. A busca por um nome esquecido leva o protagonista a questionar sua própria identidade, num jogo de linguagem e poder que escancara a falência do discurso lógico e das convenções dramáticas. O livro tem tradução de Bruno Brandão Daniel, que assina também o texto de prefácio e posfácio mais notas de Gilles Ernst. Você pode comprar o livro aqui.

2. A cantora careca marcou a estreia de Ionesco é o principal exemplo do seu “teatro do absurdo”. Inspirada por um manual de ensino de língua inglesa, a obra transforma diálogos banais entre dois casais britânicos em um espetáculo de repetições, incoerências e automatismos. Ao desmontar o sentido da linguagem e expor o vazio das convenções sociais, Ionesco cria uma sátira radical sobre a comunicação e o comportamento burguês no pós-guerra. A peça estreou mundialmente no Théâtre des Noctambules, em Paris, em 16 de maio de 1950. Foi montada pela Compagnie Nicolas Bataille, sob a direção do próprio Bataille; em 1952 e novamente 1957, passada a fria recepção da estreia o texto é reencenado por Bataille no pequeno Théâtre de la Huchette, também em Paris, junto a A lição, outra peça de Ionesco, dirigida por Marcel Cuvelier, com revezamento dos atores. A partir de então, a parceria entre os três é renovada e as peças tornaram-se um sucesso na cena parisiense. O livro tem tradução e prefácio de Dirce Waltrick do Amarante. As duas peças saíram pela editora Temporal. Você pode comprar o livro aqui.

A Companhia das Letras antecipa a publicação do próximo livro de László Krasznahorkai. O romance de 2016, O retorno do Barão de Wenckheim, sai em dezembro e é apresentado como uma espécie de desfecho magistral para o universo colocado em marcha em Sátántangó.

Após décadas de exílio na Argentina, um velho aristocrata arruinado por dívidas de jogo, o barão Béla Wenckheim, regressa à sua cidade natal, uma localidade húngara perdida no mapa e mergulhada em poeira, loucura e ressentimento. Os habitantes, desesperados, projetam no Barão a figura de um salvador, alguém que poderá trazer redenção e prosperidade ao lugar. Em meio a vigaristas de toda ordem, uma gangue de motociclistas e um professor recluso que observa o mundo em colapso com ironia e terror, o que vemos é a chegada de um homem cansado, que só deseja reencontrar seu amor de juventude, e talvez, num gesto derradeiro, reconciliar-se com o mundo. Riso, vertigem e devastação se combinam numa inesquecível polifonia de vozes orquestrada por um dos autores fundamentais do nosso tempo, aquele a quem Susan Sontag chamou de “o mestre húngaro do apocalipse”. A tradução é de Zsuzsanna Spiry. Você pode comprar o livro aqui.

Publicam-se no Brasil, pela primeira vez, os contos completos de José Donoso.

Em seus contos, Donoso revela temas e obsessões que, reencenadas e aprofundadas, se tornarão marcas distintivas de sua produção literária: as minúcias da vida privada, os contrastes de classe, incursões psicológicas, o purgatório de algumas instituições sociais, a observação fina do chiaroscuro humano, o ruído branco ao fundo do cotidiano mais banal. Neles, Donoso testa sua musculatura e estilo literários. Contos completos amplia a presença da obra desse escritor no catálogo da editora Mundaréu; tradução de Bruno Cobalchini Mattos. Você pode comprar o livro aqui.

Nova edição e tradução de um dos de Natsume Soseki, até hoje como um dos escritores mais populares e lidos do Japão
 
Originalmente publicado em 1914, dois anos antes da morte do autor, Kokoro é o romance mais conhecido de Soseki. Estruturado em três partes, sua narrativa se passa ao final da era Meiji e gira em torno da diferença geracional entre os protagonistas, refletindo as tensões de uma sociedade em transformação.  Porém, mais do que um retrato de época, este texto expressa um conflito a céu aberto entre o individualismo e o senso de dever social. E desse conflito nascem profundos questionamentos sobre a dificuldade de se abrir ao outro, o peso da culpa e os dilemas da confiança.  Na primeira parte, “O professor e eu”, um jovem estudante (narrador), se aproxima de um homem mais velho a quem passa chamar de professor. Aos poucos, por meio de conversas, o jovem começa a perceber sentimentos de solidão e culpa que sempre pairam ao redor do professor.  Na segunda parte, “Meus pais e eu”, acompanhamos o narrador em sua terra natal, enfrentando dilemas pessoais e familiares. Já na última parte, “O professor e o testamento”, o professor ganha centralidade por meio de uma longa carta e traz essas questões à tona de forma dilacerante, como se seu próprio coração pulsasse nas entrelinhas das palavras ali escritas, revelando a história por trás de sua juventude e explicando o seu desprezo pela humanidade. É nesse desfecho que o romance alcança seu ponto mais profundo e o leitor se depara com a perspectiva de o mundo como algo assombroso e intrincado. Como uma obra que possibilita novas interpretações a cada leitura, Natsume Soseki apresenta em Kokoro retratos da complexidade do coração e da fragilidade das conexões interpessoais. Seu título reúne múltiplos sentidos: coração, mente, alma, espírito, sentimento, determinação, essência, de forma que uma simples tradução literal da palavra resultaria em uma apreensão incompleta de seu significado. Elegante e melancólico, este romance é um mergulho nos labirintos da consciência, naquilo que não se diz, mas que molda vidas inteiras. Uma obra que fala da impossibilidade de escapar da solidão — e da necessidade de entendê-la com honestidade.  Publicação da editora Estação Liberdade; tradução de Junko Ota. Você pode comprar o livro aqui.

Toda a ficção de Edgar Allan Poe em dois volumes reunidos numa caixa em edições de luxo.

Ficção completa de Edgar Allan Poe reúne, em dois volumes, todos os contos escritos por um dos maiores mestres da literatura fantástica e das tramas de suspense, além de seu único romance, A narrativa de Arthur Gordon Pym de Nantucket. Em uma obra que atravessa o horror psicológico, o mistério, o grotesco e o sublime, Poe nos convida a mergulhar nas profundezas da mente humana e do desconhecido. Organizado por Oscar Nestarez, especialista na obra do autor, a caixa traz, além da tradução cuidadosa dos contos feita por Maria Luiza Borges, Regiane Winarski e Wagner Schadeck, textos biográficos que revelam aspectos da vida, do contexto social e da visão de mundo de Poe. A edição conta ainda com ilustrações exclusivas de Eduardo Belga, criadas especialmente para acompanhar o tom sombrio e hipnótico de sua ficção. Um convite irresistível à leitura de um dos escritores mais influentes da literatura ocidental. Publicação da editora Nova Fronteira. Você pode comprar o livro aqui.

Do que é feita uma identidade? De quantos erros, contradições, mudanças ideológicas? Thiago Souza de Souza nos mostra no seu segundo romance a jornada de Fanta.

E esta jornada começa pela infância da protagonista dedicada à Igreja, passa por uma juventude de cineasta subversiva e deságua, já adulta, em se tornar ministra de um governo de extrema-direita. Em Do teu fantasma vejo só o coração a jornada de uma mulher enigmática — dividida entre a religiosidade e uma produção artística radical — se mescla com a do tio, internado compulsoriamente por alcoolismo, e a do filho, que, como ela, lida com uma exposição indevida na internet. Nesta trama, repleta de complexidades e espelhamentos, articulam-se temas candentes de maneira única, evitando maniqueísmos e julgamentos fáceis. Um romance delicado sobre como as vidas são moldadas também pelos erros que cometemos. O livro saiu pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.

Romance de estreia de Victor Vidal olha para as relações familiares com linguagem visceral.

Ao receber um telefonema dizendo que sua mãe havia desaparecido após protagonizar uma série de escândalos na vizinhança (como tentar arrastar uma criança para dentro de sua própria casa), Ana precisará retornar ao endereço onde jurou jamais colocar os pés novamente. O que encontra ao entrar na casa da mãe a surpreende: pegadas de lama pelo chão, lixo por toda parte, móveis destruídos. O que teria acontecido com Andrea durante os cinco anos em que as duas cortaram contato uma com a outra?
Não há pássaros aqui é uma meditação ― frequentemente dolorosa, mas sempre esclarecedora ― sobre como aquilo que vivemos na infância pode ter as mais inesperadas consequências durante a vida adulta.  Publicação da editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.

Livro de Henri Focillon é apresentado como um dos grandes ensaios de reflexão estética e antropológica que o século XX produziu

“Empreendo este elogio da mão como quem cumpre um dever de amizade. No momento mesmo em que me ponho a escrever, vejo minhas próprias mãos que solicitam meu espírito, que o arrastam.” O elogio da mão foi publicado originalmente em 1939 como apêndice a Vida das formas, ficou por muito tempo à sombra do texto mais longo que o historiador francês dedicou às noções de tempo, espaço, forma e estilo. Uma pena, pois a ousadia do Elogio não se limita ao brilho da prosa de Focillon e faz pensar em autores como Warburg, Benjamin ou Merleau-Ponty.  Ao destronar o olhar da posição de eminência que sempre foi sua no campo do pensamento estético, ao afirmar o primado da mão ativa e criadora no nosso trato com o mundo e com as formas, Focillon formula uma série de desafios a nosso modo habitual de pensar a arte e a criação, o desígnio e o acidente. Para ele, o artista é um “homem antigo” que, em plena era mecânica, reencena com suas mãos a descoberta do mundo e da natureza. Assim, afirma Focillon, “recomeça, perpetuamente, um formidável outrora, assim se refaz, sem se repetir” o passado “de uma raça humana que não esqueceu o privilégio de manipular”. Publicação da Editora 34; tradução de Samuel Titan Jr. Você pode comprar o livro aqui.

Escrito em parceria com Sabina Anzuategui, o último livro de Jean-Claude Bernardet, um dos mais importantes críticos de cinema do país

Em Viver o medo, uma das várias incursões de Jean-Claude Bernardet pela ficção, os dois autores ficcionalizam as aventuras sexuais de um homem que, ao envelhecer, se percebe impotente. O professor de cinema Thomas Tremblay é soropositivo, tem câncer de próstata e está cego. Para piorar, leva mais um golpe do destino: fica impotente depois de um tratamento para o tumor. Esse problema não é exatamente novidade. A impotência sempre foi um medo ― literal e metaforicamente ― a pautar sua vida. Aos oitenta e sete anos, saudoso das tórridas experiências gozadas e pronto para enfim enfrentar a realidade, decide escrever suas memórias sexuais. Sozinho, porém, não consegue, e sua ex-aluna Milena lhe dá uma mãozinha nessa trama. Jean-Claude Bernardet e Sabina Anzuategui registram em detalhes cenas eróticas ― em quitinetes, banheiros, hotéis ― da juventude de Tremblay, em contraposição a momentos de fragilidade do cotidiano de um homem gay idoso para quem o sexo (consumado) há anos não faz mais parte da rotina. Ao subverter a autoficção e criar uma espécie de metalivro das aventuras de Bernardet (e, por que não, também de Sabina), os autores chegam a esta história, uma “novela de memórias” sobre a impotência como metáfora da vida. Publicação da Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.

RAPIDINHAS 

Dalcídio Jurandir. Depois de publicar Passagem dos inocentes há dois anos, a jovem editora Folheando apresenta mais um romance do escritor paraense — Belém do Grão-Pará.

Outra vez te revejo Popol Vuh. A Ubu reimprimiu a belíssima edição que fez um clássico da literatura na América Latina. Esgotado deste sua publicação, o livro retorna aos leitores. Tem tradução de Josely Vianna Baptista, ilustrações de Francisco França e texto de introdução de Adrián Recinos. 

Os aforismos de Baltasar Gracián. A Relicário publica uma edição de luxo com tiragem limitada e trilíngue (português, espanhol, inglês) reunindo trezentos aforismos do jesuíta que se tornaram célebres desde 1647. 

Os aforismos de Baltasar Gracián. Com tradução de Patrícia Silva de Barros e Elvyn Laura Marshall e textos de Monica Figueiredo, Maria de la Concepción PiñeroValverde, Ricardo Leite, Mauricio Planel e Guto LAcaz, A arte da sabedoria mundana tem ilustrações de Pojucan. 

OBITUÁRIO

Morreu Paulo de Tarso Correia de Melo.

Paulo de Tarso Correia de Melo nasceu em Natal no dia 5 de abril de 1944, cidade de onde se ausentou prolongadamente apenas quando foi morar nos Estados Unidos, onde cumpriu parte de sua formação acadêmica; ele era formado em Pedagogia e foi professor nessa área na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Foi também fora do país que se iniciou na poesia, gênero que cultivou em destaque ao longo da vida; escreveu ainda crônica e ensaio. A estreia na literatura aconteceu em 1993 com Talhe rupestre, embora o seu primeiro livro tenha sido Natal: secreta biografia, que organizado no regresso dos Estados Unidos só seria publicado em 1994, mesmo ano em que apresenta os poemas de Folhetim cordial da guerra em Natal e cordial folhetim da guerra em Parnamirim (1994); destacam-se ainda Romances de Alcaçus (1998), Casa da metáfora (2002), O sobrado das palavras (2005), Sabor de amar (2010), Livro de linhagens (2011), Misto códice (2012), entre outros. Paulo de Tarso Correia de Melo era membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras. Ele morreu no dia 21 de outubro de 2025.

DICAS DE LEITURA

1. Guerra em surdina, de Boris Schnaiderman (Editora 34, 288p.) Este romance passa em revista a partir do relato de um soldado brasileiro o que foi a campanha da Força Expedicionária durante a Segunda Guerra Mundial desde o seu desembarque em Nápoles em 1944. Você pode comprar o livro aqui

2. O amor pela pátria e outras histórias, de Andrei Platônov  (Trad. Maria Vragova, Editora Ars & Vita, 136p.) Oito contos que revisitam cenas do cotidiano da vida camponesa na Rússia da primeira metade do século XX. Você pode comprar o livro aqui

3. Biografia de um olho, de Ibrahim Nasrallah (Trad. Safa Jubran, Tabla, 164p.) A vida de Karima Abbud, a primeira mulher fotógrafa do mundo árabe, reimaginada pelas tintas da ficção. Você pode comprar o livro aqui

VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS

A Biblioteca Nacional do Brasil divulgou que encontrou uma assinatura de Machado de Assis. A descoberta dos servidores da Divisão de Manuscritos se deu quando estudavam um dossiê relativo à concessão de uma patente industrial. Sabemos que o escritor desempenhou diversas funções no serviço público nacional, entre elas, a de Diretor-geral de Viação da Secretaria de Estado dos Negócios da Indústria, Viação e Obras Públicas; entre as responsabilidades do cargo estava a de emitir a concessões de patentes aos autores de invenções ou descobertas industriais no Brasil. Foi nessa posição que analisou o pedido do austríaco Carlos Amstetter para ter a exclusividade dos direitos de sua invenção, um sistema hidropneumático para transporte de madeira. A assinatura foi encontrada na folha do processo em que Machado de Assis exprime sua concordância e da concessão assinada por Floriano Peixoto, datada de 25 de outubro de 1892.

BAÚ DE LETRAS

No nosso arquivo o leitor encontra alguns materiais em torno da obra do poeta Paulo de Tarso Correia de Melo. Em 2010, quando publicava o livro Sabor de amar, reproduzimos este texto da jornalista Maria Betânia Monteiro seguido de um poema do poeta. Mais tarde, nosso então colunista Márcio de Lima Dantas resenhou aqui Talhe rupestre: poesia reunida e inéditos. Do autor, propriamente, reproduzimos durante o mês de outubro de 2008 o ensaio em que revisita a poesia de Zila Mamede, “Itinerário e exercício da poesia” em cinco partes. 

E, por destacar Eugène Ionesco, recordamos outra de suas obras através deste texto de Juliano Pedro Siqueira, ainda na entrada do nosso baú. Ele comenta a peça O rinoceronte. Leia aqui.

DUAS PALAVRINHAS

Diferente do pintor ou do músico, o escritor não é um artista, mas um artesão. Há muito trabalho envolvido em juntar as peças para que tudo funcione.

— Eduardo Mendoza

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