Boletim Letras 360º #536

 
Adolfo Bioy Casares e Jorge Luis Borges. Foto:  Héctor Atilio Carballo


LANÇAMENTOS
 
Um acontecimento literário. A história de uma profunda amizade. Um diálogo vigoroso. Pela primeira vez num único volume tudo o que escreveram juntos dois dos autores latino-americanos entre os mais influentes.

Bioy & Borges: obra completa em colaboração reúne todos os romances, contos, crônicas e textos esparsos que os argentinos Adolfo Bioy Casares e Jorge Luis Borges escreveram juntos durante meio século. É o registro da mais emblemática parceria da história da literatura e, sobretudo, a história de uma amizade intensa. Quando se conheceram, no início da década de 1930, Bioy tinha dezessete anos, e Borges, pouco mais de trinta. Borges conta que um dos principais acontecimentos de sua vida foi o início dessa relação. A partir de então, e por muito tempo, passaram a se encontrar quase que diariamente para discutir textos, inventar e aperfeiçoar personagens e tramas. Bioy escrevia e ambos debatiam o enredo, norteados por uma série de regras: oralidade triunfante, propostas alternadas, exigência mútua, direito permanente de veto, prioridade ao jogo e ao prazer. “Começamos a escrever”, diz Borges, “de um jeito que não se parecia nem a Bioy nem a Borges. Criamos entre os dois um terceiro personagem que só existe quando estamos conversando”. Com posfácios de Davi Arrigucci Jr., Júlio Pimentel Pinto e Michel Lafon, este livro é uma ode à cumplicidade de dois dos autores mais extraordinários. Uma obra-prima a ser descoberta e redescoberta. Com tradução de Maria Paula Gurgel Ribeiro, o livro sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui

Todos os últimos contos de Anton Tchékhov reunidos numa edição. 

Poucos escritores são tão influentes quanto o russo Anton Tchékhov (1860-1904) quando se fala em ficção curta. O conjunto de textos traduzido por Rubens Figueiredo e reunidos em Últimos contos traz alguns dos contos mais celebrados do autor, como “A dama do cachorrinho”, “Um caso médico” e “A noiva”, entre outros exemplos dessa produção dos anos finais do escritor. São todos os contos escritos entre 1898 e 1903. É o testamento — ainda vivo na arte da melhor ficção breve — de um dos autores fundamentais da literatura mundial. O livro sai pela editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.

Eleito um dos melhores livros de 2022 pela New Yorker, Vogue e NPR, livro aborda a branquitude por um triz. 

Anders não reconhece o homem que o encara diante do espelho. De um dia para o outro, sua pele escureceu. Ele não é mais branco. Outros casos começam a surgir pela cidade, o caos se alastra e as tensões raciais se intensificam. Diante do inimaginável, a tristeza, a fúria e a confusão tomam os personagens. Vizinhos, amigos e familiares correm da transformação como se fugissem de uma espécie de praga. Numa alegoria extraordinária sobre a contemporaneidade, Mohsin Hamid impressiona ao mostrar como a mudança de uma simples característica — a cor da pele — pode virar a vida de um indivíduo de cabeça para baixo. Sem querer explicar por que essa transformação dramática acontece, mas explorando o impacto que esse fato provoca na sociedade, o escritor paquistanês se inspira em referências literárias que vão desde A metamorfose, de Franz Kafka, ao Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago. O último homem branco, com tradução de José Geraldo Couto, sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.

O primeiro título da obra de Bukowski na HarperCollins Brasil sai em edição comentada e nova tradução de Emanuela Siqueira, com posfácios do acadêmico Marcus Vinicius Santana Lima e da escritora Clara Averbuck.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o escritor amador Henry Chinaski é dispensado do serviço militar. Quando a única coisa que podia fazer era lutar no front, passa transitar entre múltiplos empregos informais em busca de uma subsistência que lhe garanta apenas quartos sujos onde morar, relações com garotas de programa e a embriaguez diária da qual não abre mão. Mas, apesar da existência às margens, o que o move é o sonho de ser um autor publicado. De um dos escritores mais reverenciados da literatura americana contemporânea, Charles Bukowski, Factótum narra mais um episódio da vida turbulenta de seu alter ego Henry Chinaski, um uma evocação magistral e vívida da urbanidade, do alcoolismo e da precarização do trabalho. Você pode comprar o livro aqui.

Um novo livro do poeta Júlio Castañon Guimarães. 

Em Sequências, Júlio Castañon Guimarães põe em cena, de forma tensa, um paradigma construtivista bastante presente, entre nós, no panorama das artes visuais e também no da poesia. É tenso o gesto realizado pela poesia do autor mineiro porque tal paradigma comparece em seus poemas ― não para ser repetido ou celebrado, e sim para ser encarado, desafiado e transformado. Afinal, nesta obra, o desejo de ordem e justeza não se diferencia do que é precário e inacabado. A linha do desenho que risca a superfície do papel tanto instaura limites quanto os torna indefinidos. Isso para não falar dos passos dados à noite que levam o caminhante a um destino desconhecido: “quando o onde não é o que importa ― aí a viagem?”. Desse modo, vamos, de palavra em palavra, por um percurso em que abismo e método são faces de uma mesma moeda. Nestas páginas, a “forma informe” luta consigo mesma para dar a ver, por exemplo, um limão, uma laranja ou ainda um rapaz de quem vemos apenas o braço e o torso. Por falar em imagem, Castañon ― diante de uma paisagem de Cézanne, do acervo do Masp ― anota: “pensar em paisagem, / quando de fato se trata de um retrato”. Ler o gênero da paisagem em Cézanne como retrato (outro gênero da pintura) pede uma mudança de ângulo radical que, entre outras coisas, abala as ficções e dramas do eu. É assim que, discretamente e em tom menor, a poesia de Castañon segue com força total, pesquisando linguagens e mudando a tradição de lugar. O livro sai pela Fósforo/ Luna Parque Edições. Você pode comprar o livro aqui.

O novo romance de Joca Reiners Terron. 

Onde pastam os minotauros dá sequência aos romances anteriores do escritor brasileiro, nos quais a diagnose selvagem da realidade social se expressa por meio de uma fabulação perturbadora. Mitologia, poesia e tragédias recentes do país surgem numa trama cheia de suspense, narrada quase minuto a minuto no transcorrer de um dia, mas também pontuada por visões do passado recente e longínquo, como fragmentos de sonho compondo um único e grande pesadelo. O livro é publicado pela editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.

Um segundo romance de Augusto Abelaira pela Almedina Brasil.

Os desertores é a segunda obra de Augusto Abelaira, publicada em 1960, dois anos depois de A cidade das flores. Apesar de menos bem recebido pela crítica, o aproveitamento das potencialidades da técnica novelística é aqui ampliado. Por um lado, uma narração maioritariamente feita na terceira pessoa, e muito assente no diálogo, é reforçada pela inclusão de indicações cénicas — como se de uma peça de teatro se tratasse — que ajudam à visualização das cenas descritas e permitem a explicitação das emoções das personagens. Por outro, o foco narrativo desloca-se entre as várias personagens através de dois mecanismos técnicos: o discurso indireto livre, que revela o seu íntimo, passando do interior de uma ao de outra por vezes sem qualquer interrupção; e a interferência de vozes de fundo nos diálogos das personagens principais. Mais do que uma descrição racional das ações e das personagens, o que Abelaira busca é mostrar o mundo como é sentido por uma classe jovem, lisboeta e burguesa que perdeu a esperança trazida pelo pós-guerra. É uma classe que deserta da intervenção pública e justifica a sua inação com a de todos os outros, mas nunca deixa de procurar realizar o desejo de pleno e de futuro, próprio da juventude. Como referiu Óscar Lopes, o que Abelaira faz “de melhor [...] foi sempre representar, uma vez e outra vez, o momento em que fomos jovens e namorados”. O desejo de juventude, evidenciado pela atração de Berenice por César, ou de cortar as amarras do passado e de renascer para uma vida nova, como Ramiro tenta em Itália, mostram-se em tensão com a vida em Lisboa, condicionada pelo imobilismo, pela família e pela censura. O livro sai pelo selo Minotauro. Você pode comprar o livro aqui.
 
Em seu sexto livro de poesia, Bruna Beber conduz o leitor por um caminho limiar entre tempo e espaço, vida e morte.

“Pai celestiá/ ninguém sabe quem varre nossas porta/ Se vento ventoso, vento de arrasá/ ou vento de ninar cantiga/ Por isso santa Rita nóis canta/ advindo disso santa Rita nóis reza”. Com uma prece, pedindo licença, entramos no novo livro da poeta Bruna Beber. Veludo rouco é dividido em quatro partes — “Amor e morte”, “Natureza e fantasia”, “Ofício e graça”, “História e geografia” —, cada qual uma vereda por onde se aventurar em torno de diferentes tempos, vozes e lugares. Circulando por ruas de São Paulo, Rio de Janeiro ou do sul da África, invocando personagens vivos e mortos, a autora constrói a cada verso um lugar próprio, nos convidando a visitá-lo e conhecer seus habitantes. “Nas frestas dessas estranhas grandezas”, escreve Luiz Antonio Simas, que assina o texto de orelha, “a poesia vai se aconchegando grudada à vida, como os quebra-queixos da meninice grudavam nos dentes e arrancavam obturações”. Veludo rouco sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.

RAPIDINHAS
 
Regresso 1. Reiteradas vezes Hilda Hilst se referiu ao romance Madona dos parámos como um grande feito da nossa literatura. A obra do seu autor, o sul-mato-grossense Ricardo Guilherme Dicke, finalmente receberá nova edição.
 
Regresso 2. A casa que passará a publicar a obra de Guilherme Dicke é a Record e prepara para essa estreia em 2024, o romance bem-quisto por Hilda Hilst.
 
Bandeirola de não-ficção 1. A casa publica dois livros de ensaios: Não ficções – a literatura, a ficção científica, os escritores e seus escritos, de Braulio Tavares; e Um estranho tão familiar – teorias e reflexões sobre o estranhamento na ficção, de George Amaral.
 
Bandeirola de não-ficção 2. Os dois livros estão em fase de captação de recursos pelos leitores interessados em obtê-los. Para saber mais sobre o projeto, e claro, deixar seu apoio, basta visitar aqui.
 
Sór Juana Inés de la Cruz. A Machado Editora anunciou a publicação de uma antologia de poemas inéditos em português da poeta mexicana.

OBITUÁRIO
 
Morreu Cormac McCarthy.

Cormac McCarthy nasceu em Rhode Island a 20 de julho de 1933. Estudou artes durante quatro anos na Universidade do Tennessee, uma entrada para o universo literário de onde nunca mais sairia, depois de ter passado pela física, a engenharia e a Força Aérea dos Estados Unidos. Sua estreia na literatura foi com dois contos numa revista de estudantes e depois se seguiu uma trajetória que o colocou entre os principais romancistas estadunidenses do século XX. Entre os seus romances mais conhecidos estão Todos os belos cavalos, pelo qual recebeu o National Book Award e o National Critics Circle Award, A travessia e Cidades da planície; esses três títulos formam a Trilogia da Fronteira. Aquela que seria sua Magnum Opus, Meridiano de sangue veio antes; e o romance que o faria conhecido no cinema, depois, A estrada, livro que lhe valeu ainda o Pulitzer de Ficção. Entre os trabalhos mais recentes estão o díptico O passageiro e Stella Maris. McCarthy morreu em Santa Fé a 13 de junho de 2023.

DICAS DE LEITURA
 
Durante a semana, abrimos uma pergunta aos leitores do Letras de recomendações de escritoras brasileiras que já leram e que gostariam que outros também as lessem. Selecionamos três das respostas e delas escolhemos os três títulos desta semana nessas dicas de leitura. Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. Antonio, de Beatriz Bracher (Editora 34, 192 p.) O romance passa em revista um segredo familiar de três gerações sob o ponto de vista de cada um dos seus protagonistas. Você pode comprar o livro aqui
 
2. O manto da noite, de Carola Saavedra (Companhia das Letras, 160 p.) A narrativa deste romance que se inscreve entre os mais importantes na literatura do século XX alemão acompanha o jovem Simon Tanner na vida de múltiplas estratégias de sobrevivência e em deambulações pela cidade e pela paisagem campestre suíça. Você pode comprar o livro aqui

3. Caminhando com os mortos, de Micheliny Verunschk (Companhia das Letras, 144 p.) Um romance que demonstra como o ódio às mulheres e às minorias atravessa os séculos, sobretudo quando se vale do fanatismo religioso. Você pode comprar o livro aqui
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
Avesso a qualquer estrelismo que pode se tornar a aparição pública de um escritor, são poucas as aparições de Cormac McCarthy em entrevistas. Uma dessas é uma adorável conversa com David Krakauer filmada em dezembro de 2017 em sua biblioteca em Santa Fé no Novo México. Disponível aqui no YouTube. 
 
Rodrigo Casarin, no podcast do seu blog Página Cinco, na ocasião de publicação dos dois últimos romances de Cormac McCarthy no Brasil, conversou com Daniel Galera sobre a obra do escritor estadunidense. Escute aqui

BAÚ DE LETRAS
 
Em março de 2015, nosso colunista Alfredo Monte escreveu sobre um dos principais romances de Cormac McCarthy, A estrada. Leia aqui.

O romance Antonio, de Beatriz Bracher, recomendado acima na seção Dicas de Leitura, foi comentado para o Letras neste texto de Pedro Fernandes.
 
DUAS PALAVRINHAS
 
Nem todas as palavras prestes a morrer são portadoras da verdade e a bênção que proporcionam não é menos genuína por se ver privada dos seus fundamentos.
 
— Em A estrada, Cormac McCarthy

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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.

Comentários

Tamy Ghannam disse…
Sempre acompanhando o Boletim Letras! Vida longa ao melhor blog de literatura do Brasil!

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