Fiama Hasse Pais Brandão





Conheci dias duradouros,
o sol tão longo entre manhã e tarde.
Um levantar súbito de luz
por trás da crista das heras no muro velho,
e depois descer no verão entre grades verdes
e para além do portão como a cair no Hades,
no inverno. Não havia tempo
nos dias longos, mas a passagem diária
do sol abençoado.

– “Idade”, Fiama Hasse Pais Brandão


Fiama Hasse Pais Brandão nasceu em Lisboa, no dia 15 de agosto de 1938, e apesar de se destacar na poesia e no teatro, foi também ensaísta e tradutora – nesta última atividade verteu para o português obras de autores como Robert Lowell, John Updike, Bertolt Brecht, Antonin Artaud, Novalis, Anton Tchekhov.

Frequentou até o terceiro ano o curso de Filologia Germânica, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, lugar onde se iniciou também nas artes; por exemplo, foi aí, em conjunto com outros, como o poeta Gastão Cruz com quem esteve casada por um tempo, que participou na fundação do Grupo de Teatro de Letras, uma das companhias de teatro universitário mais antigas e prestigiadas em Portugal; isso ao lado de outros nomes importantes da poesia portuguesa do século XX, como Luiza Neto Jorge. 

Antes da fundação da companhia em 1965, sua atividade com o teatro já era uma constante: Fiama fizera parte do Teatro Experimental do Porto e frequentara cursos na Fundação Calouste Gulbenkian e participara na criação do Grupo de Teatro Hoje. Ainda antes desse período, ganhara um prêmio como Revelação da Sociedade Portuguesa de Escritores pela obra Os chapéus de chuva, que não foi seu primeiro trabalho; este foi Em cada pedra um voo imóvel, de 1957, obra também premiada com o Prêmio Adolfo Casais Monteiro. Sobre este trabalho, a crítica sempre entendeu a presença da leitura de Fiama sobre o teatro japonês e o convívio com o mundo onde cresceu, em Carcavelos.

Em cada pedra um voo imóvel teve sua primeira expressão como um conjunto de  poemas dramáticos e poemas em prosa que deixaria de ser acrescento às antologias que vieram depois; não se encontra nem em Obra breve (2006) e só este ano Gastão Cruz se encarregou de reeditar estes textos.

Participou ativamente do movimento Poesia 61 ao lado de nomes como Maria Teresa Horta, o próprio Gastão Cruz, Casimiro de Brito. Então, cada poeta publicou-se numa plaquete e Fiama trouxe a público Morfismos, um conjunto com catorze textos que mais tarde integra os seus primeiros trabalhos com a poesia. Entre outros do mesmo gênero, citáveis, são: Barcas novas (1967), Novas visões do passado (1974), Âmago (1985), considerado como sua Magnum OpusF. de Fiama (1986) e Três rostos (1989); no teatro, publicou também A campanha (1965), Quem move as árvores (1979) e Teatro-teatro (1990).

“A obra de Fiama comemora a boa nova, ler não é conforme procura impor a indústria cultural de estados repressivos, mero entretenimento alienado, pois, tal como escrever, é acto de criação revolucionário. Ler e escrever são, portanto, práticas significantes que se aliam numa produtividade dita texto. Quer dizer que ser leitor é função de ser escritor e a leitura, potencialidade da escrita.”, escreve Jorge Fernandes da Silveira no ensaio “Lápide e versão” ressaltando como o projeto poético da poeta se apresenta como questionamento da própria linguagem.

Na prosa aparece Em cada pedra um voo imóvel, título que em 2009 é reeditado reunindo toda sua obra no campo da ficção e do teatro, O aquário, O retratadoFalar sobre o falado. O único texto considerado pela crítica como narrativa relativamente longa foi Sob o olhar de Medeia, e a novela poética Movimento perpétuo (1991), apesar de ter deixado vários outros contos editados postumamente numa antologia chamada Contos de imagem (2006); neste último livro se apresentam três contos trabalhados no final da década de 1990 e também uma peça inédita, Noites de Inês-Constança.

Fiama Hasse Pais Brandão morreu em Lisboa a 19 de janeiro de 2007.

***

Abaixo preparamos um catálogo com fac-símiles de seis poemas da poeta publicados entre 1976 e 1983 na revista Colóquio / Letras.


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