Aquela ida indevida ao cinema

Por Pedro Fernandes

Muita beleza para nada. Idas e vindas do amor, um símbolo de pura perda de tempo no cinema. 

São muitos os filmes que assistimos; mas aqueles que marcam de verdade são poucos. No meu estágio de leigo na sétima arte sempre digo que filme bom é aquele que de alguma forma incita-nos a pensar por outro ângulo aquilo que é tido como supostamente corriqueiro. Isso é algo que tem sido pouco valorizado ultimamente. As telas estão preocupadas, e mais agora com a ascensão do 3D, com filmes de muitos efeitos visuais e pouco ou quase nada de enredo.

Além do rol desses filmes pobres de enredo e rico em efeitos visuais há ainda um outro: os dos filmes ricos em bestialidade mas que ainda assim por motivo desconhecido escapa com um bonzinho; são divertimentos para dias quando estamos interessados pelo banal, afinal que mortal não já terá se dado ao desfrute de queimar algumas horas caras da existência com nada. É também, às vezes não apenas o caso de querer jogar o tempo no ventilador, mas de quando se tem certo apego pela sétima arte (assim como se tem pelos livros e tanto os compra e não consegue ler todos) e já depois de ter visto todos considerados bons, numa e noutra tarde no shopping resolver ver um desses filmes, mesmo desconfiando muito seriamente de que nunca pagaria para vê-los.

Apesar de muito curta essa experiência (a decepção com os filmes ruins são mais com aqueles alugados, comprados ou vistos na TV) tive duas visitas ao cinema, recentemente, e por esse motivo, as notas. Há bem pouco tempo eu só comentava aqui os títulos dessa esfera dos bons; agora, é possível que me dê o trabalho de falar mal dos ruins, principalmente daqueles que lhe seduzem pelo trailer e depois são pura decepção. Tem esses e são os de tipo pior; entre matar o tempo por gosto e perder o tempo com desgosto há uma diferença muito grande.

Mas, as duas experiências motivadoras dessas notas se referem ao primeiro caso: uma foi com a comédia romântica que ainda circula em cartaz Idas e vindas do amor fatídica tradução para Valentine 's day. O filme do diretor de Uma linda mulher preocupa-se em mostrar como que o dia dos namorados influencia a vida de casais - de muitos casais - jovens, maduros, a se conhecerem, gays etc. Uma trama leve, adocicada por um humor barato, o filme foi feito para mero passatempo. Está no rol dos bonzinhos. Não traz nenhuma reflexão a não ser a já conhecida de todo o senso comum: de que os homens e mulheres não são de se fiar - ambos podem dizer agora que amam e minutos depois se arrependerem do que disseram; ou ainda que amor não tem idade, sexo ou cor; ou mais ainda, há sempre um sapato velho para um pé cansado.

Mas a maior imbecilidade que já pude ver sentado na poltrona do cinema, agora que me lembro, não foi com Idas e vindas do amor, mas a comédia Se beber não case. Contando em duas palavras um filme sobre três amigos que vão para Las Vegas curtir uma festa de despedida de solteiro, mas perdem o noivo à distância de 40h para o início da cerimônia. Na manhã seguinte, todos estão de ressaca e ninguém se lembra do que aconteceu na noite anterior. E nisso tudo uma bestialidade atrás da outra acontece (um tigre no banheiro do quarto do hotel, uma galinha, um dente a menos e um bebê e por aí vai) para que, enfim, o fim aconteça conforme deveria ser. Mas o grave de tudo não é nada: é saber que um filme ridículo e recheado de clichês consegue ser uma das comédias mas bem vistas pelo público estadunidense. E depois dizem que o público brasileiro não sabe ser crítico para com o que veem.

Bom, tais males se dão nas melhores famílias. Mas, espero poder usar meu tempo com coisas de melhor valia; o texto fica como registro da necessária pesquisa antes de se aventurar no cinema por se aventurar. Também um alerta para quem ainda não viu esses filmes correr deles.


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