João Almino

Por Pedro Fernandes



Não é tanto de praxe hoje, mas houve um tempo em que, para se tornar um escritor reconhecido, obrigatoriamente, o sujeito deveria largar sua terra de origem e ir para o eixo Rio de Janeiro e São Paulo à cata de um lugar ao sol. Todo escritor era então um desgarrado da sua terra. É verdade também que as razões para esse virar as costas para a terra de origem são resquícios de um modo brasileiro e sobretudo potiguar – porque é o estado do Rio Grande do Norte o lugar que estou tomando em questão.

Conheço muito pouco de João Almino para dizer se ele foi um desses obrigados a se desgarrar para construir sua carreira literária. Pode ter sido, mas também sabemos, pelas recolhas biográficas que circulam na internet, nem sempre confiáveis como sabemos, que o escritor natural de Mossoró fez uma carreira promissora e à parte da atividade literária. A diplomacia também cobra do diplomata a vida nômade fora de sua terra natal. A escolha da profissão impôs a Almino o lugar do cosmopolita, que se impôs ao da necessidade de reconhecimento, se alguma vez isso houve.

Ao sublinhar isso, eu também um deslocado da minha terra de origem, e por necessidades econômicas, não quero defender que um escritor (ou qualquer homem) tenha de nascer, criar, procriar e morrer na terra de nascença. Hoje, mais que em outros tempos, respiramos toda força do cosmopolitismo. Talvez porque nunca tenhamos deixado de ser os nômades da primeira idade da humanidade. 

O distanciamento de João Almino de sua terra natal parece que marcou certo esquecimento dos que aqui ficaram. Sendo um escritor já reconhecido, dentro e fora do seu país, seu nome era até a algum tempo um quase desconhecido nosso – pelo menos para mim, um total desconhecido. Bastou se ampliar um pouco mais a aura do escritor, para que seu nome voltasse a aparecer nos jornais do Rio Grande do Norte: em agosto, ele voltou a receber um dos importantes prêmios literários. Depois do reconhecimento cubano da Casa de las Américas, em 2003, pelo que é um dos seus livros mais comentados pela crítica, As cinco estações do amor, João Almino foi agraciado com o Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura 2011 de melhor romance publicado em língua portuguesa os últimos dois anos.

O livro premiado é Cidade livre, um engenhoso romance que se apropria de algumas das técnicas mais usuais do nosso tempo de virtual, como a escrita para um blog como este, e restabelece ficcionalmente o levantamento da cidade de Brasília, a coroação radical do nosso modernismo. Este título refere ao modo como os trabalhadores que foram recrutados para erguer as então inusuais formas da arquitetura de Oscar Niemeyer chamavam a futura capital do país.  

João Almino é além de escritor e diplomata, autor de carreira acadêmica. Cursou seu doutorado em Paris sob orientação do filósofo Claude Lefort. Foi professor na Universidade de Brasília, no Instituto Rio Branco e em outras instituições fora do Brasil, como a Universidade Nacional Autônoma do México, Universidade de Berkeley, Universidade de Stanford e Universidade de Chicago. Ele nasceu em 27 de setembro de 1950.

Sua obra transita – como se nota pelas duas carreiras principais que segue – em duas vertentes: a da prosa ficcional e da prosa não-ficcional. Na primeira publicou Ideias para onde passar o fim do mundo (1987), com o qual foi indicado para o Prêmio Jabuti e ganhou o Prêmio do Instituto Nacional do Livro e o Prêmio Candango de Literatura; sete anos depois, Samba-enredo (Prêmio Casa de las Américas); a que se seguiram, até agora, As cinco estações do amor (2001), O livro das emoções (2008), o referido Cidade Livre (2010). Esses livros constituem um ciclo de romances designado como Quinteto de Brasília.

Já na segunda vertente, a da prosa não-ficcional, João Almino possui várias publicações das quais destaco, no ensaio literário, Brasil-EUA, balanço poético (1997), Escrita em contraponto (2008) e O diabrete angélico e o pavão: enredo e amor possíveis em Brás Cubas (2009); no ensaio filosófico e político, saíram, até agora, Os democratas autoritários (1980), A idade do presente (1985), Era uma vez uma Constituinte (1985), O segredo e a informação (1986) e Naturezas mortas: a filosofia política do ecologismo (2004).

O escritor mantém uma página onde é possível ler um tudo sobre a sua carreira além de ver alguns vídeos seus e fragmentos do livro premiado em agosto, Cidade livre. 



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