La La Land: a melodia do amor

Por Maria Vaz



Amantes e expectadores circunstanciais da sétima arte trouxeram La La Land para o aplauso geral. Nomeado para 14 óscares da academia, a sua estreia fez furor em salas de cinema de todo o mundo. O filme ganha pelo glamour de um Hollywood de tempos idos, pelo charme e a química dos personagens principais, ou pelo toque de beleza imaterial que tem o jazz ao entrar no ouvido. Ganha pelo início colorido e divertido, no trânsito; pelos cenários bem conseguidos; pela diversão, leveza e, sobretudo, pelo carisma das personagens. Não obstante tudo isso, confesso que achei tudo muito normal e previsível até à segunda metade do filme. E digo isto porque não é novidade um romance desenvolver-se em um musical. Ainda que se trate de um romance engraçado e dinâmico, mais essencial do que formal, não estava a surpreender-me. Com 14 nomeações, esperava mais.

Contudo, na segunda metade do filme deixei-me embeber na história e nos outros elementos que a constituem. Perdi-me em algo paradoxal. Em pequenas claridades que o filme exalta. Por um lado, a vida bela, envolta em festas e sorrisos adornados pelos sonhos daqueles que, ainda hoje, para aquela cidade se mudam. Por outro, a difícil tarefa de conseguir encarar a crítica e a rejeição, enquanto se continua a tentar sem perder a esperança. Por essa altura, pensei: quantos artistas não se reverão neste cenário em vários cantos do mundo?

As personagens principais são Mia e Sebastian: uma jovem atriz em busca do papel que lhe garantiria o salto para a ribalta e um jovem pianista, amante de jazz. Apaixonaram-se perdidamente, deixando na mente daqueles que assistem o filme, a imagem icónica e romântica do pôr-do-sol em uma das colinas com vista para Hollywood. Não obstante, o que mais gostei em La la land foi o afastamento do cliché: não termina no foram felizes (juntos) para sempre. Foram só felizes juntos. Mas isso bastou para que marcassem a vida um do outro.  Ou melhor: acabaram por ser a ‘conditio sine qua non’ da felicidade (futura) um do outro. Entendam porquê.

Após ter sido rejeitada para vários papéis, Mia decidiu dar tudo de si na interpretação de um monólogo inédito, da sua autoria, e apresentá-lo em um teatro da cidade, na expectativa de que algum caçador de talentos o assistisse. Enquanto isso, Sebastian tinha-se rendido à ideia de que não poderia tocar jazz para conseguir a fama, o sucesso e o dinheiro que precisava. Tinha, desde há muito, o sonho de ter um club de jazz, onde animaria as noites dos apreciadores que por lá passassem. Todavia, ao ouvir uma chamada entre a sua amada Mia e a mãe, que a questionava acerca da profissão do namorado, decidiu trocar o jazz pelo comercial e ir tocar piano para uma banda em digressão. Sebastian não conseguiu, por isso, acompanhar as exposições do monólogo de Mia, que atingiu o ponto limite: não tinha mais força para insistir. A distância geográfica acabou por gerar a distância no relacionamento (aquele que tanto queriam que desse certo).

Perdida na dúvida entre o sonho e o negativismo de uma hipotética fantasia ou impossibilidade, Mia resolveu desistir, fazer as malas e regressar a casa dos pais. Sebastian continuou o seu dualismo entre a razão (que se traduziria na visibilidade, fama e dinheiro a tocar um estilo que detestava) e o coração (o seu jazz, que não tinha muitos admiradores na cidade). Todavia, Sebastian regressa à casa que dividira com Mia, quando o telefone toca: recebe a notificação de que Mia seria esperada para uma audição relativa a um papel em um filme importante. Resolve, então, ir buscar Mia a casa dos pais, percorrendo, teimosamente, uma distância enorme de carro: encontrou a localização certa com base na informação que tinha retido em conversas passadas. Reencontram-se. Conseguiu convencê-la a não desisti. Mia fez a audição e conseguiu o papel para o filme. Ficou muito feliz. Mas teve que se mudar para Paris.

Chegado a este ponto da história, o filme poderia acabar por aí. Mas não acaba. E foi isso que, verdadeiramente, me surpreendeu como expectadora. Passam-se anos. Mia reaparece na cidade no papel de mãe, com um companheiro, com quem sai para jantar. O ritmo do filme abranda. Voltamos ao trânsito, com que se inicia o filme, que continua infernal. Há uma gradação. Um contraste. Agora é noite. Então, para fugir desse trânsito, o companheiro de Mia faz um desvio, em uma curva: como se isso fosse a indicação futura de que fora trilhado outro caminho de vida. Nessa altura cria-se, de igual modo, uma espécie de sinal de nostalgia: foi naquele trânsito caótico – e nas reacções desprovidas de paciência – que Mia e Sebastian se conheceram. Trata-se, igualmente, de um sinal do filme para o que se desenrolaria de seguida: após o jantar, o companheiro de Mia perguntou-lhe se não queria entrar em um clube nocturno daquela rua. Entraram e sentaram-se para ouvir uma música. Surpresa: quem estava sentado no piano era Sebastian(!). A música desse momento: emocionante e fenomenal. O filme volta atrás no tempo e mostra mentalmente tudo aquilo que poderiam ter vivido juntos: o que não viveram; uma espécie de ‘what if(?)’. 

No final, olharam-se nos olhos e sorriram. Ela foi embora. Ele continuou a tocar. Por mais que tenham seguido as suas vidas, foram peças essenciais na vida um do outro: apoiaram-se mutuamente na ‘arte’ de sonhar. De insistir e resistir. E resultou: ela tornou-se uma atriz famosa e ele abriu o seu club de jazz.


Comentários

Anônimo disse…
La La Land: Cantando Canções pode não ser tão divertido e criativo mas é bom filme. Ryan Gosling também tem ótimas performances. É de admirar o profissionalismo deste ator, trabalha muito para se entregar em cada atuação o melhor, sempre supera seus papeis anteriores, o demonstrou em Dos Caras Legais, aqui: http://br.hbomax.tv/movie/TTL604333/Dois-Caras-Legais os detalhes, um filme que se converteu em um dos meus preferidos.

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