Musicar Manoel de Barros

Manoel de Barros e o músico Márcio de Camillo. Foto: Arquivo pessoal de Márcio de Camillo

Não é para qualquer um o trabalho de musicar um poema; há alguns que são gerados para esse fim, há outros que nem tanto, embora seja natural que, com ou sem rima, longo ou curto, o poema seja ‘portador’ de certa musicalidade como se fosse de sua natureza ser um intermédio entre a verbal e o sonoro. Há resultados que não agradam ao ouvido, mas no Brasil, notável é o trabalho de autores como José Miguel Wisnik que tem no currículo a composição a partir de poemas Gregório de Matos, ou Fagner, cantor que já musicou Florbela Espanca, Cecília Meirelles, Ferreira Gullar, ou Caetano Velloso (Fernando Pessoa), ou ainda Adriana Calcanhoto (Augusto de Campos), entre outros.

Agora, o músico Márcio de Camillo, depois de um projeto pedagógico desenhado para trabalhar canções a partir da obra de Manoel de Barros para o público infantil traz a lume um CD organizado só com músicas que são poemas do poeta. Crianceiras teve incentivos do próprio poeta e da filha, Martha Barros, quem compôs as ilustrações para a ideia.

Capa do CD Crianceiras. Os desenhos foram confeccionados pela filha de Manoel
de Barros, Martha Barros. 

No total, são dez poemas musicados a partir de textos dos livros Poemas concebidos sem pecado, o primeiro escrito pelo poeta, O livro das ignorãças, título mais conhecido do autor, Livro sobre nada e Poemas Rupestres, apesar de o músico ter ido também a títulos que Manoel de Barros escreveu para o público infantil, como O fazedor de amanhecer e o recente Memórias inventadas para crianças. A seleção dos textos tomou como ponto de partida as várias personagens criadas pelo poeta.

O trabalho levou cerca de cinco anos para ficar pronto e ser lançado ano passado. Desse tempo, três anos foram debruçados sobre os livros de Manoel de Barros na pesquisa, leitura e seleção dos textos e outros dois na gravadora.  Na produção das músicas já desde 2007 até o ser finalmente pronto e ser gravado Camillo, disse que esse período não foi nada fácil: inserir na métrica musical versos nada lineares como os de Barros foi um dos grandes desafios do trabalho. “Toda poesia tem uma melodia. É igual você ler um livro e escutar voz do personagem. Mas a métrica dele é singular, diferente de Paulo Leminski, Mário Quintana." – explica.

Márcio de Camillo em cena do musical Crianceiras. Foto: Arquivo pessoal de Márcio de Camillo.

A proposta que no princípio era apenas o de utilizar a música como uma ferramenta para aproximar o público infantil da obra do poeta, já rendeu um lugar entre os três de melhor álbum infantil de 2012 do Prêmio da Música Brasileira, além de servir de base a criação de um musical. Isso graças a ideia de fazer das personagens a linha mestra para as músicas do disco.  O espetáculo dirigido por Luiz André Cherubini mistura teatro, música, dança, animações e poesia. As animações do musical foram produzidas a partir dos desenhos de Martha Barros, que depois de tudo foram transformadas em videoclipes.

Enfim, um rico projeto que foi se desdobrando em vários outros de igual qualidade. E tudo em torno da não menos rica obra de um dos poetas brasileiros ainda vivos dos mais quistos.

O projeto Crianceiras mantém um canal no Youtube onde é possível acessar boa parte das gravações do CD - basta ir por aqui. Antes, não deixem de visitar a página do projeto, aqui.




Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Boletim Letras 360º #576

O som do rugido da onça, de Micheliny Verunschk

Boletim Letras 360º #575

Boletim Letras 360º #570

Dalton por Dalton

Boletim Letras 360º #574