Cinco títulos inéditos de J. D. Salinger a serem publicados a partir de 2015

J. D. Salinger. O escritor deixou pelo menos cinco títulos e instruções para publicação. Foto: Weinstein Company

J. D. Salinger, que morreu em 2010, aos 91 anos, foi conhecido por uma obra literária notável, mas escassa, reduzida ao enorme sucesso de seu romance de 1951, O apanhador no campo de centeio. Mas, a biografia e o documentário, ambos com lançamento nas próximas semanas nos Estados Unidos (falamos a respeito em outras duas matérias para este blog – a primeira aqui, e a segunda aqui), apresentam, entre as novidades, a existência de inéditos: há informações seguras de que o escritor deixou aos responsáveis por seu espólio claras instruções para a publicação de pelo menos outros cinco livros – alguns deles com enfoque completamente próximo daquele que perseguiu até 1951.

Nesse rol, há uma série de títulos que, segundo o The New York times começarão a ser publicados a partir de 2015. Os novos livros foram em grande parte escritos durante o período em que foi sendo ampliada a reclusão de Salinger. Da série a ser chamada The family glass - que já inclui um conjunto de três novelas, Franny & Zooey; Raise High the Roof Beam, Carpenters and Seymour: An Introduction -, por exemplo, aparece uma continuação com mais um título em que a família Glass é personagem na narrativa.  

Nas instruções deixadas por Salinger estão ainda a uma versão corrigida de um conto já conhecido publicamente, mas que não chegou a ser publicado, The last and the Best of the Peter Pans. O texto deve ser recolhido junto outros textos sobre os Caulfields, entre eles Holden Caulfield, o pivô da narrativa de O apanhador no campo de centeio. As novas obras incluem ainda uma espécie de um manual histórico repleto de filosofia religiosa Vedanta, com a qual Salinger estava profundamente envolvido na época, um romance ambientado na Segunda Guerra Mundial e que toma por base seu primeiro casamento, e outro romance inspirado nas suas experiências durante a guerra.

As revelações são a prova concreta do que muitas vezes disseram os que estiveram perto de Salinger durante as suas décadas de reclusão: o escritor nunca deixou de escrever assiduamente depois que publicou seu último texto. O fato é que ninguém nunca havia dado atenção para esses escritos e nem atentado para os extensos planos de publicação póstuma redigidos pelo próprio Salinger.  

Em parte porque os responsáveis pelo espólio do escritor nunca tiverem interesse em tocar nisso. Matthew Salinger, filho de J. D., que compartilha essa responsabilidade com a viúva do autor, Collen O’Neill, sempre recusou-se a discutir sobre esses planos, sobre a biografia e o filme que estão em vias de publicação. Numa entrevista dada ao The New York Times em maio deste ano, Matthew Salinger disse que não acreditava que o livro em questão e o documentário fossem aprofundar-se tanto a ponto de buscar uma compreensão acerca da figura reclusa do pai e nem ganhar a repercussão pública que vem ganhando. A improbabilidade de que esse trabalho rendesse alguma coisa está associada ao fato de que Salinger, disse Matthew, confinou suas relações a um pequeno círculo de sete ou oito pessoas.

Paul Fitzgerald. Que foi amigo de Salinger durante toda a vida e de quem Salerno tem um diário de guerra com informações do amigo escritor.

O documentário é dirigido por Shane Salerno, cineasta que levou nove anos pesquisando e produzindo o filme, que está previsto para ser lançado pela Weinstein Company em 6 de setembro e depois será transformado numa série para a PBS. O livro também foi escrito pelo cineasta numa parceria com David Shields e será publicado pela Simon & Schuster três dias antes da estreia do documentário. O material que tem se mantido sempre em sigilo tem sido revelado esporadicamente por um pesquisador que diz ter feito, de fato, uma verdadeira devassa pela vida de Salinger – material que se multiplica entre fotografias inéditas, centenas de cartas e até mesmo um diário de guerra que pertenceu a um dos amigos que conviveu com o escritor durante sua vida inteira, o já falecido soldado Paul Fitzgerald. Em resposta ao desafio do filho de Salinger, Salerno responde: “Se isso não for um círculo interno, eu não sei o que é um círculo interno.”

O interesse de publicação só foi tomado já bem tardiamente ao andamento de sua pesquisa para o documentário. Tanto o filme quanto o livro atribuem as informações à fontes anônimas que aparecem descritas no livro como independentes e separadas. Mesmo se recusando ao detalhamento, Salerno acredita que a credibilidade nascerá quando vier a tona as mais de 690 páginas do livro, bem como a leva de horas de filmagens. Inicialmente, Salerno contava com a cooperação e apoio dos membros da família de Salinger, mas depois, esse apoio se retirou.

Tanto o filme quanto o livro estão sendo apresentados com a promessa de revelações sobre Salinger, cuja privacidade tornou-se uma marca exclusivamente sua. Na semana passada, a editora iniciou uma campanha publicitária - próxima a da divulgação do documentário (você pode ver aqui) que inclui uma imagem de Salinger com um dos dedos sobre os lábios, como se pedisse silêncio, sob uma advertência: “Desvendar o mistério, mas não estragar os segredos.”

Classificando como “uma grande façanha jornalística”, Jonathan Karp, editor da Simon & Schuster, diz que a aparição dos manuscritos inéditos já é uma grande revelação ou conquista do trabalho de Salerno e Shields e espera que sejam eles produtores de um dos maiores eventos editoriais do ano, se não da década.

Juntos, o filme e o livro, fornecem detalhes específicos em torno da vida de um autor que foi de soldado durante a invasão da Normandia e um dos primeiros a entrar  no campo de extermínio Kaufering IV, ao reformado que sofreu um colapso mental e voltou para os Estados Unidos com sua primeira mulher, a alemã Sylvia Welter, para encontrar a fama literária.

Entre as tentadoras revelações prometidas, estão detalhes e fotografias dessa primeira esposa de Salinger. Quando os dois se conheceram era 1945 e ele trabalhava como agente de contraespionagem a investigar nazistas que estavam na clandestinidade. O livro apresenta elementos suspeitos da vida de Welter, sugerindo que ela pode ter sido informante da Gestapo, possibilidade que surgiu entre os amigos de Salinger depois da separação do casal e do fim da guerra. O casamento, de fato, não durou tanto tempo; semanas depois que voltaram e os dois já estavam em Nova York, “ela encontrou na mesa de café da manhã uma passagem aérea de retorno imediato para Alemanha”. 

Outra questão apresentada no livro e no filme e que proporcionará muita intriga entre os estudiosos de Salinger é o encontro do escritor com uma garota de 14 anos de idade, Jean Miller, num resort numa praia da Flórida. Durante vários anos os dois trocaram correspondências e chegaram a morar um tempo juntos em Nova York. O relacionamento findou tão logo os dois se envolveram sexualmente. Segundo Miller, ela foi referência para que Salinger escrevesse um de seus contos: “For Esmé – With Love and Squalor”, diz, não teria sido escrito, se Salinger não a tivesse conhecido.

***

Enquanto mais novidades não chegam, deixamos aos leitores os recortes de um conto, o primeiro, de J. D. Salinger publicado na edição da The New Yorker em 21 de dezembro de 1946: "Slight Rebellion off Madison". De acordo com a biografia do escritor, produzida por Paul Alexander, este conto foi submetido à revista ainda em 1941, mas compreendendo que os Estados Unidos não estavam preparados para receber uma história do tipo na época, os editores seguraram o texto até 1946.






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